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Baldini: 'Voo Vasp 375 pode ter sido estudado por Bin Laden para ações do 11 de Setembro. Vamos conferir'

Diretor de 'Bruna Surfistinha' dá detalhes do filme sobre sequestro do avião no Brasil, que terminou com um morto e um ferido, e da série 'O Rei da TV', sobre Silvio Santos, que ele acaba de concluir

Entrevista|Eduardo Marini, do R7

Baldini (à frente, de malha azul) vai dirigir filme sobre o 'quase' 11 de Setembro brasileiro
Baldini (à frente, de malha azul) vai dirigir filme sobre o 'quase' 11 de Setembro brasileiro Baldini (à frente, de malha azul) vai dirigir filme sobre o 'quase' 11 de Setembro brasileiro

No dia 29 de setembro de 1988, seis dias antes da promulgação da atual Constituição Brasileira, um Boeing da linha 375, da Vasp, decolou do Aeroporto Internacional de Porto Velho, em Rondônia, com 135 passageiros e oito tripulantes. O destino seria o Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio de Janeiro, com previsão de quatro escalas.

No último trecho do voo, entre Belo Horizonte e o Rio, um dos passageiros, Raimundo Nonato Alves da Conceição, anunciou o sequestro da aeronave com um revólver calibre 32 em punho. E ordenou ao piloto, Fernando Murilo de Lima e Silva, e ao copiloto, Salvador Evangelista, que desviassem a rota em direção a Brasília.

O objetivo de Conceição: obrigar piloto e copiloto a jogar o avião, com mais de cem pessoas a bordo, entre passageiros e tripulantes, contra o Palácio do Planalto, sede do Governo Federal. Desempregado e com problemas financeiros, o sequestrador pensava em matar o então presidente José Sarney, ainda que seu plano alucinado custasse a vida de tanta gente — e também a dele.

Durante o voo, Conceição matou o copiloto Evangelista porque ele tentou contato com o controle de voo após ter percebido que o comandante transmitira um sinal de alerta máximo pelo transponder, sem que o sequestrador percebesse. Evangelista atendeu ao chamado do controle, que desejava confirmar se o alerta era verdadeiro. Conceição ficou desconfiado e o fuzilou com um tiro na nuca. Outro copiloto, que viajava como passageiro, foi ferido ao tentar impedir o sequestrador de entrar na cabine.

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Depois da exigência de Conceição de um novo desvio de rota, agora para São Paulo, o piloto Lima e Silva, na tentativa de desestabilizar o sequestrador, fez uma manobra arriscada até mesmo para aviões bem menores. Deu um tonneau, giro completo através do eixo longitudinal da aeronave, e desceu numa queda, em parafuso, por alguns milhares de metros. Dessa forma, conseguiu iludir Conceição e pousar em Goiânia, e não em São Paulo, como o sequestrador queria.

O avião foi cercado pela Polícia Federal ao pousar em Goiânia. Conceição exigiu um avião menor para seguir até Brasília levando Lima e Silva como refém. No momento em que entraria no avião menor, o piloto tentou fugir correndo e foi atingido na perna por um disparo dado pelo sequestrador.

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O sequestrador foi baleado com três tiros. Morreu três dias depois, no hospital — segundo os laudos, por anemia falciforme. O piloto Lima e Silva morreu aos 76 anos, aposentado, em 26 de agosto de 2020, de diabetes e problemas cardíacos, em Búzios, na Região dos Lagos do Estado do Rio, onde morava.

A missão atual do carioca Marcus Baldini, diretor de sucessos como Bruna Surfistinha, Os Homens São de Marte… e È para Lá que Eu Vou e O Homem Perfeito, é contar em filme a história desse episódio — que, se concluído como desejava o sequestrador, teria provocado uma das maiores tragédias da história do país. O Sequestro do Voo 375 terá roteiro de Lusa Silvestre, produção da Estúdio Escarlate Conteúdo Audiovisual e coprodução da LTC Produções.

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“Estamos conferindo a informação de que reportagens sobre esse voo foram encontradas na casa de Osama Bin Laden após sua morte. O líder da Al-Qaeda teria estudado esse sequestro, até para entender o que deu errado para o sequestrador”, revela Baldini nessa conversa com o R7 ENTREVISTA.

O diretor dá detalhes também da minissérie O Rei da TV, sobre a trajetória de Silvio Santos, produzida pela Gullane Entretenimento para a Disney e exibida pela Star+. A série conta a trajetória de Silvio Santos. Cheiro de sucesso. Acompanhe:

Cinema e dramaturgia não podem ser apenas episódicos. Episódios%2C sozinhos%2C não contam uma boa história. O que faz um bom filme ou projeto dramático é a combinação de episódios%2C personagens e contextos

(MARCUS BALDINI)

Dirigindo Deborah Secco no filme 'Bruna Surfistinha'
Dirigindo Deborah Secco no filme 'Bruna Surfistinha' Dirigindo Deborah Secco no filme 'Bruna Surfistinha'

O sequestro do voo Vasp 375 tinha potencial para, 13 anos antes, ser o ‘11 de Setembro brasileiro’?

Marcus Baldini – Talvez em parte. Mas imagine se termina com o avião no Palácio do Planalto, com a morte do presidente e de todos lá dentro, além dos que estavam no avião? Eu tinha 14 anos, mas não me lembro muito do sequestro quando ele aconteceu. Estou achando muito interessante estudar e lançar luz sobre esse episódio importante. Acho até que ele é pouco lembrado diante da importância e dos riscos que envolveu. A discussão sobre segurança no tráfego aéreo, por exemplo, foi fortalecida no Brasil a partir do voo 375 e colocada sob parâmetros mais rigorosos, agora no mundo, depois do 11 de Setembro. A lado do temor normal pelos acidentes, com esses dois episódios o medo dos atentados foi incorporado muito mais intensamente por grande parte das pessoas. No mundo, claro, muito mais pelo 11 de Setembro. Estamos conferindo a informação, mas nos passaram que reportagens sobre o sequestro do voo 375 foram encontradas no bunker de Osama Bin Laden após sua morte. Se for verdadeira, significa que ele estudou o episódio, até mesmo para entender os erros do sequestrador.

O episódio é dramaticamente rico, né? Teve até assassinato do copiloto em pleno voo.

Pois é. É comum a gente ouvir, no meio do cinema e fora dele, que determinada boa história daria um bom filme. Neste caso, a afirmação é verdadeira. Como já fiz coisas baseadas em fatos reais, algumas adaptações de livro e de personagens, sei que adaptação é um caminho árduo. Muitas vezes, na hora de construir uma estrutura de dramaturgia, faltam eventos, e em outras até sobram, como no caso da série O Rei da TV. Às vezes falta uma linha de narrativa que costure os eventos. Porque o cinema e a dramaturgia não podem ser apenas episódicos. Episódios, sozinhos, não contam uma boa história. O que faz um bom filme ou projeto dramático é a combinação de episódios, personagens e contextos. Uma coisa que me interessou muito no projeto desse filme foi a situação da sociedade naquele momento, durante o Plano Sarney, a nova Constituição, a volta da democracia e das liberdades civis, mas com mellhoria de vida ainda distante da maioria da sociedade.

Os familiares do piloto Lima e Silva dizem que ele morreu um pouco magoado.

Isso. Ele nunca foi reconhecido oficialmente pelo governo por ter evitado a queda do avião sobre o Palácio do Planalto. De acordo com o que ele dizia, e segundo os relatos de familiares após sua morte, o piloto jamais recebeu um telefonema ou agradecimento, por exemplo, de José Sarney. Então, esse episódio, além da força dramática, traz, de certa forma, a história de duas pessoas que, de formas tão diferentes, queriam ser heróis. Um, o sequestrador, falido, sofredor, por um ato maluco de protesto que acabaria com a vida de muitos e também com a dele. Do outro, o piloto, que fazia o primeiro voo após uma suspensão, fez manobras e adotou condutas arriscadas para evitar uma tragédia que envolveria o topo do poder no país e não se sentiu reconhecido. Um se sentindo traído pela situação econômica do país. E o outro, pela falta de reconhecimento. É curioso isso, não?

Com o pessoal da Força Aérea (o segundo da esq. para a dir.) e da produção do novo filme
Com o pessoal da Força Aérea (o segundo da esq. para a dir.) e da produção do novo filme Com o pessoal da Força Aérea (o segundo da esq. para a dir.) e da produção do novo filme

Muito. Você falou da série O Rei da TV. Como foi adaptar para a dramaturgia a vida e a trajetória daquele que talvez seja o maior comunicador da história da televisão brasileira?

Sabe aquela combinação de episódios, personagens e contexto de que falamos? Pois bem: retratar a trajetória do Silvio Santos, sob esse ponto de vista, é um projeto que, imagino, existe na cabeça de todo brasileiro. Era bola quicando, pedra cantada. Os próprios produtores mantinham havia muito tempo o interesse de fazer — uma ideia, imagino, compartilhada por todos os outros do meio no Brasil.

A série não foi autorizada por Silvio Santos.

Verdade. Tivemos a coragem de fazer uma dramaturgia baseada em fatos públicos para ver de que forma ela poderia unir o lado esperado ao desconhecido. Nossa ideia era mostrar lados desconhecidos do Silvio, mas também as coisas conhecidas, porque não se pode decepcionar o público fã de um personagem com essa dimensão. Não se pode frustrar o espectador, mas também existe o lado reflexivo, de luz e sombra sobre o personagem, a crítica. Para mim tudo isso é fundamental, porque tenho como método não fazer trabalhos chapa-branca.

A série 'O Rei da TV' não é autorizada pelo Silvio, mas nunca recebi nenhuma pressão nem mensagem dele ou em nome dele. Jamais soube de alguma vontade dele nesse sentido. Os exibidores queriam anunciar comerciais da série na TV aberta, incluindo o SBT. O que soubemos é que Silvio autorizou pessoalmente a veiculação dos comerciais em sua rede. Isso é super Silvio Santos, totalmente Silvio Santos

Vocês sofreram alguma pressão ou tentativa de controle por parte de Silvio Santos ou de sua família?

De minha parte, zero. E, até onde sei, os produtores também não sofreram nada. Desde que o projeto foi anunciado, nunca recebi nenhuma mensagem dele ou em nome dele. Jamais soube de alguma vontade dele nesse sentido. Os exibidores queriam anunciar comerciais da série na TV aberta, incluindo o SBT. O que soubemos é que Silvio autorizou pessoalmente a veiculação dos comerciais em sua rede.

Não autorizar, mas aceitar os comerciais, tudo isso é a cara do Silvio Santos, não?

Totalmente, Silvio Santos, super Silvio Santos. Tento ser muito leal ao que imagino da pessoa como personagem. Por isso, é claro, gostaria muito de saber o que ele achou.

Marcus brilhou na direção da série 'O Rei da TV', sobre Silvio Santos
Marcus brilhou na direção da série 'O Rei da TV', sobre Silvio Santos Marcus brilhou na direção da série 'O Rei da TV', sobre Silvio Santos

Bruna Surfistinha, o filme baseado na autobiografia O Doce Veneno do Escorpião, da ex-garota de programa Raquel Pacheco, causou polêmicas do tamanho do sucesso que fez, com mais de 2 milhões de espectadores nos cinemas. Como foi a experiência de dirigir esse trabalho?

A rigor, foi meu primeiro longa-metragem. Como disse sobre meu estilo, tive várias coisa adaptadas na vida da Raquel para o filme. Eu me sentia muito responsável sobre a forma como iria contar aquela história. Mas você está mexendo com uma coisa forte, que é como a imagem de alguém ficará para milhões de pessoas, e, muitas vezes, a versão fala mais alto do que o fato. Tenho certeza de que toda uma geração mais recente, e parte das futuras, conhecerão o cantor Freddie Mercury, do Queen, na maior parte pelo que viram no filme Bohemian Rhapsody.

Verdade.

As adaptações, no meu caso, acontecem em sintonia com o que imagino ser parte da verdade da personagem. A Raquel tinha duas irmãs. Criei um irmão que ela não tinha. Ao assistir ao filme, ela falou: "Nossa, tenho tenho muito medo desse irmão". Argumentei: "Mas ele só existe no filme". E ela: "Mas é como se existisse, porque ele diz o tempo todo exatamente o que meu pai falava". A preocupação, em alguns pontos, é menor com os fatos do que com a coerência da emoção, da honra e da ética da personagem. Faço adaptações, mas não rompo com aquilo que, imagino, a pesonagem faria. Por isso, grande parte dos homens que foram ver o filme pensando apenas nas situações sensuais com uma atriz como a Deborah Secco e das mulheres atraídas pela curiosidade saiu do cinema refletindo sobre as dificuldades encontradas pela Raquel sob o ponto de vista humano. Esta é uma das metas principais do meu cinema: combinar divertimento com reflexão.

Quais são seus diretores e filmes prediletos?

Difícil resumir, porque olho o trabalho das pessoas como profissional. Há, claro, muita gente boa. Como você pediu para citar algo, gosto dos irmãos Joan e Ethan Coen e admiro o trabalho de direção do Fernando Meirelles. Entre os filmes, Era uma Vez na América, de Sergio Leone, e o argentino O Filho da Noiva, de José Juan Campanella.

Quais são seus próximos projetos?

Tenho dois principais para 2023: um filme sobre o comércio ilegal de madeira na Amazônia e uma série baseada num livro do escritor colombiano Héctor Abad Gómez, em parceria com a produtora Conspiração.

Boa sorte.

Muito obrigado.

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